O mal uso de palavras como “mesmo”, “assertividade” e “independente”, bem como o excesso de neologismos e redundâncias, são erros de português comuns cometidos por quem quer falar “bonito”, mas acaba fazendo feio na gramática.
Você é do tipo que gosta de dar uma “enfeitada” nas palavras para parecer mais formal ou profissional? Este texto é pra você!
Nas próximas linhas, listo os principais erros de português cometidos por quem ainda não entendeu muito bem o que, realmente, significa “falar bonito”.
1. O tal do “mesmo”
A palavra mesmo é um pronome demonstrativo, mas mesmo assim o termo é frequentemente utilizado no lugar de pronomes pessoais, como “ele” e “ela”, e possessivos, como “seu” ou “dela”. Percebemos isso em discursos, entrevistas e postagens de muita gente que tenta forçar uma certa formalidade.
Veja um exemplo:
“Antes de comprar um produto, o consumidor deve avaliar a real necessidade do mesmo.”
Pode soar bonito ou “diplomático” por um instante, mas se você repetir a frase algumas vezes na cabeça vai perceber que, além de incorreta, essa construção é de muito mau gosto.
A popularização desse erro de português, acredite ou não, está na legislação paulistana. A lei municipal 9502/97 tornou obrigatória a fixação de placas de advertência na entrada dos elevadores com o intuito de evitar acidentes, mas não teve o mesmo cuidado com a língua portuguesa. Confira o trecho em que o erro aparece:
Artigo 1º – Os prédios comerciais, edifícios de apartamentos, escritórios e outros estabelecimentos congêneres, públicos ou particulares, dotados de elevadores, ficam obrigados a fixar junto às portas externas desses equipamentos plaquetas de advertência aos usuários, com os seguintes dizeres: “Aviso aos passageiros: antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado neste andar.”
A palavra “mesmo” pode ser empregada de diversas formas em uma frase. Observe alguns exemplos de uso correto:
- “Todo dia, a mesma rotina.”;
- “Mesmo que fosse capaz, não faria.”;
- “Gostaria de sentir o mesmo que ela.”;
- “Este suco tem o mesmo gosto da fruta.”;
- “Dá no mesmo ir de carro ou de ônibus.”;
- “Vou trabalhar aqui mesmo.”;
- “O ser humano, por si mesmo, não é capaz de resolver todos os seus conflitos.”.
Agora, alguns exemplos de uso indevido do “mesmo” (sem trocadilhos) seguidos por suas respectivas correções:
- Errado: “É fundamental compreender a ciência e os pilares da mesma.”;
- Correto: “É fundamental compreender a ciência e seus pilares.”.
- Errado: “Antes de comprar um produto, o cliente deve avaliar a real necessidade do mesmo.”;
- Correto: “Antes de comprar um produto, o cliente deve avaliar a sua real necessidade.”.
- Errado: “Antes de entrar no elevador, verifique se o mesmo encontra-se parado neste andar.”;
- Correto: “Antes de entrar no elevador, verifique se ele encontra-se parado neste andar.”;
- Alternativa também correta: “Antes de entrar no elevador, verifique se a cabine encontra-se parada neste andar.”.
Sendo assim, você não deve usar “mesmo” para evitar repetir palavras ditas na mesma frase ou trecho. Nesses casos, você deve utilizar pronomes possessivos (como “seu” ou “sua”) e pessoais (como “ele” ou “ela”) ou um sinônimo.
2. A tão cobiçada “assertividade”
Arrisco dizer que essa é a palavra preferida da turma do RH. O problema é que a tal “assertividade”, que tanto se prega em palestras e posts de empresas de gestão de pessoas, tem um significado bem diferente do que os gurus da internet acreditam. Vejamos, então, o que o dicionário tem a dizer:
Significado de Assertividade: (1) Substantivo feminino; característica de assertivo, do que ou de quem afirma algo de maneira categórica, com firmeza; objetividade. (2) Psicologia: característica de quem se expressa com segurança, demonstrando decisão em suas palavras; autoconfiança.
Se você ler dois ou três posts de qualquer blog de empresas de recrutamento, desenvolvimento pessoal ou software de gestão, notará imediatamente que há algo errado no uso da palavra assertividade e suas variações. É um erro de português comum nesse tipo de contexto.
Muitas pessoas associam a palavra “assertividade” (com “ss”) com a palavra “acerto” (com “c”). Por essa lógica, ser assertivo seria tomar decisões certas ou com maiores probabilidades de acerto. Que gestor não se interessaria por isso?
O fato é que não é bem assim. Embora a definição da psicologia se aproxime dos “mantras” da galera da motivação, acredito que, como bons oradores e escritores, devemos evitar palavras capazes de gerar interpretações ambíguas. Assertividade é uma delas.
Se você diz que um líder é assertivo, por exemplo, creio que a maioria das pessoas entenderá que ele é confiável, firme e toma decisões ponderadas. Entretanto, os mais afiados no português podem interpretá-lo como rígido, cabeça dura ou inflexível.
Um exemplo polêmico para você praticar e refletir:
“Bolsonaro foi um presidente assertivo.”
Observe que essa afirmação pode agradar tanto apoiadores quanto críticos do ex-presidente, a depender da maneira como a palavra “assertivo” é interpretada. Na dúvida, portanto, não use.
3. Grande maioria, pequenos detalhes e outras redundâncias
Eis um pequeno detalhe presente na grande maioria das reportagens de jornais. Até mesmo entre redatores profissionais, há uma mania boba de encher frases de palavras com objetivo de conferir ênfase ao que é dito.
Poxa, se é detalhe, supõe-se que é pequeno. Se é maioria, obviamente é a maior parte de algo. Para que, então, encher seu ouvinte ou leitor com palavras redundantes?
Tá. Isso não é exatamente um erro de português e até pode ser utilizado, desde que não se repita com frequência. Não estou aqui para definir estilos.
Pessoalmente, porém, acredito que uma das coisas que mais enriquece um texto é justamente a economia do escritor nas palavras. Um dos melhores exercícios que um redator ou escritor profissional pode fazer é tentar dizer o máximo com o mínimo de palavras possível, sem abrir mão da norma culta.
Convenhamos que há poucas coisas tão irritantes do que aquele famoso “texto de açougueiro” (pura “encheção de linguiça”). Se for pra enrolar, melhor não dizer ou escrever nada. Seu público vai fugir num instante.
4. Independentemente e independente
Explicando sem rodeios: independente é um adjetivo, independentemente, um advérbio.
Quem é fera na gramática já entendeu. Quem não é, pelo menos notou que as palavras têm aplicações diferentes e, por isso, não devem ser usadas livremente, como se a escolha fosse opcional. Isso é um erro de português comum, mas que rapidamente se supera analisando exemplos.
“Independente” é um adjetivo que se associa a um substantivo ou termo com valor de substantivo. Em outras palavras, isso significa que independente é sempre algo ou alguém. Veja:
- “Em 1822, o Brasil declarou-se independente.”;
- “Maria decidiu ter a sua própria casa e se tornar uma mulher independente.”;
- “A nossa empresa atua de maneira independente.”.
Percebeu que a palavra “independente” sempre se refere à independência de uma pessoa, um objeto, um país ou qualquer outro indivíduo ou coisa?
A palavra “independentemente”, por sua vez, é um advérbio que modifica um verbo ou uma oração completa. Observe os exemplos:
- “Independentemente da minha vontade, terminarei esta leitura.”;
- “Votarei em quem acredito, independentemente da opinião dos meus familiares.“;
- “Nossa empresa lucrará o mesmo, independentemente disso“.
Percebeu que independentemente é equivalente a locuções como “sem levar em conta”, “a despeito de” e “não obstante”?
Uma coisa pode ser independente, independentemente de qualquer coisa.
5. Empreender, perfomar, empoderar e outros neologismos
Estes termos não são proibidos pela norma culta, até porque muitos deles, de tão utilizados, já se tornaram parte do nosso vocabulário padrão. A dica aqui é não exagerar.
Palavras como empreendedorismo (derivada do inglês “entrepreneurship”) e “performar” (derivada do verbo inglês “to perform”) caíram no gosto das empresas moderninhas. Parece haver um consenso na turma das startups que palavras em inglês vendem mais. Não é à toa que seus cargos tem sempre nomes pomposos em inglês.
Eu não sou especialista, mas isso me parece um reflexo de uma visão cultural negativa que, infelizmente, persiste: a ideia de que tudo que é do “norte” é melhor, mais interessante ou mais respeitável. Será?
Independentemente disso — agora você já sabe como usar! —, o fato é que o excesso de neologismos, na realidade, tira a credibilidade do seu discurso ou texto. Dá impressão de que seu repertório de palavras é escasso ou que você está “enfeitando” para fazer algo parecer melhor do que é.
Pior quando essas palavras são empregadas de forma distorcida. Um bom exemplo é o verbo “empoderar” que, frequentemente, é associado a movimentos sociais, como o empoderamento feminino.
“Empoderar” significa conceder poder a si ou a alguém. Dentro do contexto do empoderamento feminino, porém, exclui-se a ideia de transferência de poder, ou seja, trata-se da mulher conferir poder a si própria.
Soa estranho e incorreto dizer que uma empresa luta para empoderar suas colaboradoras, por exemplo, pois esta construção sugere que o “poder” precisa ser transferido da empresa para a mulher. A frase, portanto, distorce a visão original do termo sobre o qual faz referência e pode ser interpretada como imposição ou autoritarismo.
A conclusão deste texto, portanto, é que palavras simples e usuais, quando empregadas de maneira adequada, conferem muito mais formalidade, profissionalismo e credibilidade aos argumentos.
Os erros de português que citei são muito comuns e, depois desta leitura, você certamente vai encontrá-los com muito mais frequência. A gramática é um estudo constante, não há como fugir. O único jeito de falar bonito mesmo é revisar e se atualizar sempre.
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